sexta-feira, 12 de outubro de 2012

SETE BREVES CONSIDERAÇÕES PARA UM ANO ELEITORAL: PARTE FINAL.

O que se comprovou com o pleito do último domingo é que um senso conservador impera no Brasil. “Mas conservar o quê?”, perguntará algum leitor. Simples: conservar o cenário político brasileiro da forma como sempre se configurou. Enquanto o eleitor aceitar esse coronelismo velado que perpassa todos os veios da República, absolutamente nada se modificará. Persistirá, ao contrário, a perspectiva de que o Estado, em sua composição política, existe apenas para favorecer interesses privados completamente distantes de preocupações coletivas.
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Algo que se percebeu claramente no transcorrer da campanha eleitoral foi a “infantilização do voto”. Ou seja: o eleitor confia que determinado candidato resolverá todos os seus problemas. É a consciência do filho que deposita todas as suas expectativas em seu genitor. Perdurando essa noção, o Estado brasileiro permanecerá como “um grande pai”, jamais organizado a partir de uma tônica racional, relegando às traças qualquer lógica em prol da pura politicagem.
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O alarde em função da Lei da Ficha Limpa ocorrido nos últimos meses teve sua razão de ser. Embora alguns não tenham percebido, a Lei da Ficha Limpa serve para proteger o eleitor dele mesmo. Funciona assim: se determinado candidato detém “ficha suja”, não pode constar na urna, sendo que, por consequência, não pode receber o voto do eleitor – se pudesse, receberia. Como bem falou David Coimbra em coluna publicada semana passada na Zero Hora, a Lei da Ficha Limpa serve para que reconheçamos que não passamos de uns abobados. O absurdo é que isso é extremamente necessário.
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Não concordo com a expressão que chama as eleições de “festa da democracia”. Levada ao pé da letra, traduz um pensamento comum brasileiro que julga que o único momento de se fazer política é em ano eleitoral. Na esteira dessa percepção, visões críticas e tentativas de participação na organização do Estado acabam sufocadas, subjugadas por uma massa populacional que não deseja ser nada mais que “pelego” de alguns poucos mandatários. O brasileiro, em sentido geral, aprecia sua semelhança a um “boi de canga”.
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A composição das prefeituras, mesmo que muitos municípios importantes tenham levado seu pleito para o segundo turno, demonstrou, em âmbito amplo, um “retorno da direita” – reconhecendo-se, porém, a “permanência da esquerda” (se é que essas palavras trazem algum sentido atualmente). Parece que alguns partidos, afastados há anos do poder, fizeram das tripas coração para retornar às cadeiras dos Executivos Municipais. O problema é que esse processo trouxe consigo ramagens de interesses conhecidos por todos, os quais, anos atrás, levaram diversas cidades ao limbo da estagnação desenvolvimentista. O que fica nítido é que o brasileiro é um ser imediatista acometido de um esquecimento crônico. 
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Ainda que muitos discordem, são nas Câmaras de Vereadores que crescem as novas elites políticas nacionais. Trata-se do seu útero. O que se observou é que pouca modificação houve em suas composições, mesmo que seja impossível nesse momento traçar um diagnóstico que perpasse todos os municípios brasileiros. O mais triste nesse sentido é que a “infantilização do voto” se fez presente também aqui: se os prefeitos são vistos como “pais”, os vereadores são vistos como “padrinhos”. O preocupante é que essa atitude não difere em nada daquela dos “mensaleiros” que estão sendo julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Cada vez que um eleitor vende ou troca seu voto, surge um novo corrupto no Brasil.
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Em política, na ausência de enxadas utilizamos colheres. O que não vale é dizer que um unicórnio puxará o arado. Em tempo de campanha, isso até funciona. Mas a “Terra do Nunca” não passa de fantasia, ainda que o ser humano tenha a tendência a confiar mais na “magia” que na “realidade”. À parte isso, independente de siglas, desejo inteligência e comprometimento para todos os candidatos eleitos. Se a partir do dia primeiro de janeiro alguns colocarão em curso seus objetivos de campanha, outros colocarão na estrada sua vigilância e atenção com relação a tudo quanto será dito e principalmente feito: assim esperando, a vida segue.

2 comentários:

  1. Muito bom o texto, como costume. Concordo que a ficha limpa serve para proteger o próprio eleitor que não sabe escolher seu canditado da escolha errada. Mas fazer oque, entre não sei quantos milhões de eleitores, é utopia achar que todos irão ter capacidade de escolha e discernimento da melhor maneira possivel, e muito menos fazer escolhas visando o coletivo. Por isso, acharia muito interessante que a "festa da democracia" fosse para quem quissese participar e não obrigatoriedade.

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  2. Agradeço as gentis palavras, Adriano.

    Entretanto, compulsando o cenário político brasileiro atual, penso que o país ainda não está preparado para o voto facultativo. Se com o voto obrigatório temos tamanhos sintomas clientelistas e coronelistas, imagine o que aconteceria se o voto fosse facultativo. Infelizmente, nosso amadurecimento histórico-político, ao menos no meu entender, não atingiu patamar suficiente para dar margem a uma mudança tão grande.

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