sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

SETE BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE NADA DEMAIS: PARTE FINAL.

Sabe qual é um dos motivos da existência de uma contemporânea judicialização da política no Brasil, presenciada inclusive em Santo Ângelo? Não sabemos conviver com a democracia e igualmente pouca ideia temos do significado da palavra “cidadania”. Em vez de assumirmos a bronca por efetivas mudanças federais, estaduais e municipais das quais o país necessita, preferimos relegar ao Poder Judiciário o status de derradeira instância moral e ética da sociedade – camuflagem despropositada e perigosa, dando margem ao ativismo judicial. 
Grande parte da população brasileira ficaria exultante se chegasse alguém e dissesse: 
- Cara, esse é teu chefe, teu líder supremo. Obedece ou o pau come. 
Muito mais simples, não é mesmo? Vivamos com isso. 
Ou será que queremos fazer diferente? 
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O sonho de meio Brasil é Joaquim Barbosa pra presidente e Luciano Huck pra vice. Enquanto um lida com o relho, outro eleva o “Lar doce lar” ao nível de programa governamental. 
É aquela clássica: passa a mão e senta o tapa. 
Funciona – a existência do Estado é uma prova disso (o sexo, outra). 
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Teoria: existe uma conspiração pra que as mulheres se mostrem insatisfeitas com seus corpos. Alguns possíveis responsáveis: (a) indústria da moda, (b) indústria do entretenimento, (c) cabeleireiros badaladérrimos e (d) dietas à base de chuchu. 
Mas talvez o responsável maior seja o olhar das outras mulheres. 
Crueldade pouca é bobagem. 
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Pessoas que utilizam reticências ao final de uma frase “pra dar um ar de suspense”. 
Pergunta: nada contra, mas existe coisa mais oitava série? 
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No Brasil, se o cara quiser ganhar algum com livros e palestras, tem que misturar filosofia, administração, marketing, neurociência, física quântica, Teoria dos Sistemas e metáforas zen-budistas, pra sair por aí dando uma de sofistão em conferências país afora. 
Sempre e cada vez mais, a enganação é a base da civilidade. 
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Por que todas as operadoras de telefonia utilizam a expressão “quadrado” em vez da expressão “sustenido”? E pior: por que utilizam a expressão “estrela” em vez da expressão “asterisco”? 
Complicado. 
Talvez isso tenha relação com as traduções abrasileiradas de filmes gringos. Exemplo 1: “Ocean's Eleven” vira “Onze homens e um segredo”. Exemplo 2: “Ferris Bueller's Day Off” vira “Curtindo a vida adoidado”. 
Parece pré-escola: pra não dizer que todos provêm de um ato sexual, você fala que a “sementinha do papai encontrou a sementinha da mamãe e o bebê nasceu”. 
Infantilização é a alma do negócio – políticos e marqueteiros sabem disso há séculos. 
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Gosto musical não define ninguém. Fato. 
Mas se somos transformados naquilo que contemplamos, como diz velho provérbio, como falar do sujeito que dá banda uma da tarde com um funk dilacerando os ouvidos dos pedestres? Pura materialização de testosterona? 
Mais que isso, o que dizer dessa gurizadinha que anda em bando com o celular berrando versos ao estilo “a mulherada tá louca / subindo na mesa / arrancando a roupa / e nóis doido atrás”? Chamariz (sic) para fêmeas? 
O futuro é tenebroso. Não tenho a menor confiança nessa geração que vejo pelas ruas. Ser otário e desprovido de neurônios funcionais parece seu maior objetivo. O gosto musical apenas reflete isso. Não se trata de preconceito: trata-se de constatação. 
Conclusão: a globalização se torna evidente pela planetarização da imbecilidade – quanto mais idiota melhor.

ENSAIO DE DEZEMBRO (OU “PROLEGÔMENOS PARA O FIM DO MUNDO”).

O passado é como um tecladista de sexta tocando Wando em uma churrascaria de beira de estrada. Você sabe que é algo franco, mas também tem a consciência de que é algo patético. Relembrar é necessário. Mas está longe de ser bom. Desconfio da veracidade de todas as falas que dizem ser a infância a melhor época da vida, por exemplo. A razão é simples. Se você colocar os poréns na balança, perceberá que jamais sofreu tantas privações e/ou restrições quanto na infância. Família, escola, religião, crueldade mirim e o escambau. Por todos os lados, a criança encontra correntes ao seu ímpeto de liberdade. 

Quem nunca tomou um corridão por “fazer arte”? Pois é – tenho a teoria de que essa é uma das razões para as pessoas geralmente terem tanto pudor com a palavra “arte”. Quem sabe o inconsciente a remeta diretamente para o termo “transgressão”, de maneira que crescemos com receio de andar fora da linha em razão da punição que supostamente receberemos se a praticarmos. Será esse um dos motivos para o aparente marasmo criativo contemporâneo? Não sei, até porque não acredito em mansidão artística. Basta você vasculhar que encontrará zilhões de sujeitos antenados em sua época, interpretando essa babel atual por meio de signos que a descrevem melhor que a mais complexa teoria. 

Problema é: quem tem coragem para se arriscar no caos? Resposta é: em um contexto de mais de seis bilhões de pessoas, poucos, raros, escassos. A criação incomoda porque nos põe face a face com nosso maior temor: a finitude. A perspectiva do “criar”, envolve-nos na inevitável responsabilidade de construirmos um projeto de vida e com ele nos comprometermos. Mas quem tem tempo para pensar nisso? Pessoal tem que pagar as contas, correr atrás do diploma e se cuidar para não ser assaltado. Vivemos enclausurados em bolhas de sentido que cremos universais, mas que apenas expressam nossa falta de coragem com relação ao diverso, ao novo, ao diferente. 

Se por um lado somos individualistas ao extremo, preocupados unicamente com nossos jardins e umbigos, por outro temos pena do Will Smith e sua solidão enlouquecedora em “Eu sou a lenda”. Quando nos defrontamos com o fato de que dependemos uns dos outros para existir, tapamos essa percepção com alguma alegoria que sustente nosso insustentável estilo de vida, marcado por uma incessante produção de resíduos. Isso mesmo: resíduos, pois talvez o melhor espelho da contemporaneidade seja o lixo material e imaterial que produz. Enquanto turbinamos festas e carros com refrões absolutamente imbecis, também entulhamos planeta adentro o lixo que provém da nossa busca desenfreada pelo prazer. 

Não que seja errado, já que todos merecem e precisam gozar. Mas quando o prazer encontra eco em uma justificativa para se fazer corpo, existe algo estranho acontecendo. É aquela: medito para trabalhar melhor, caminho para regularizar a pulsação, bebo para relaxar. Por quê?! Por que não basta o ato pelo ato, livre dos penduricalhos da argumentação? Isso nos priva de olhar para fora, retira-nos a possibilidade de encontros e nos joga em um círculo cada vez mais restrito, como se fôssemos doidos que alucinam ao redor de totens absurdos criados por um jogo de símbolos que nubla a realidade. É preciso que nos deixemos levar. É preciso maior risco, rabisco, visto que do contrário jamais teremos a bela sensação de perder o chão e então nos sentirmos momentaneamente livres de tudo. Claro que angústia virá. Mas sem essa perversão do que é tachado como “normal”, o sabor da vida vira uma salada de chuchu – só tem gosto por conta do vinagre e do azeite de oliva. 

Por isso relembrar é complicado. Quando você conscientiza certas coisas, adquire o senso do erro e do acerto, visualizando em quem foi o mar de equívocos que resultou em quem é. No entremeio, muitos sorrisos e alegrias, havemos de convir. Mas aparentemente, somente aprendemos com a dor e com a culpa, o que talvez se deva a uma moralidade judaico-cristã que nos atinge do berço. Explico: cremos que a dor é que ensina, a punição é que purga, a doença é que cura – e isso está errado. Como mudar, não sei. Mas sei que existe algo de podre no Reino da Dinamarca, como diria Hamlet. 

Penso, enfim, na esteira de Montaigne, que filosofar é aprender a morrer: somente chegamos a alguma calma e serenidade quando nos acercamos completamente da nossa condição finita e da nossa solidão cósmica. Mais: isso nos remete ao outro, àquele anônimo da fila do banco, e nos impinge o senso de que estamos juntos nessa estrada, dependendo nosso rumo do reconhecimento da nossa comunhão de destinos. Sim: o tempo destrói tudo, como grita o letreiro de “Irreversível” de Gaspar Noé quando dos créditos finais do filme. Mas se promove a implosão de tudo, também relega instrumentos para a construção de sentidos fraternos a partir dessa implosão. 

Precisamos abdicar da lógica amigo/inimigo, dentro/fora, nacional/estrangeiro, estranho/normal. Tudo faz parte de uma teia imensa na qual surfarmos em co-responsabilidades de impossível renúncia. Cada pequeno ato que cometemos afeta o sangue dos outros, como certa vez constatou Simone de Beauvoir – e a nitidez desse horizonte é que pode nos transformar em melhores seres humanos, percebendo que embora a existência, assim como o amor, seja tão desprovida de significado último quanto uma carta do Pateta para o Pernalonga, existe algo muito maior que nos une e nos incute o dever de encarar todo e qualquer indivíduo como nosso igual. Isso é difícil? É. Tenho esperança de uma mudança moral e ética universal em curto espaço de tempo? Não. Mas tais constatações não me retiram a voz. Afinal, não quero que no futuro recorde do meu hoje e visualize em minha face aquele tecladista de churrascaria que certa vez me causou congestão em uma viagem para Porto Alegre. 

Se o mundo não acabar, claro.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

GABRIELA, A PORRADA E O TATU-BOLA: A HISTÓRIA DE UM CUSPE.

Na noite de 4 de outubro de 2012, a manifestação denominada Defesa Pública da Alegria terminou de maneira lamentável em Porto Alegre. De posse do argumento de que a Prefeitura da Capital, sob o comando do Prefeito José Fortunati, realiza a privatização de espaços públicos, como o Largo Glênio Peres e o Auditório Araújo Vianna, ambos patrocinados pela Coca-Cola, o protesto iniciou na Praça Montevidéu de forma pacífica e animada, reunindo centenas de pessoas. Em torno das 22h30min, os ativistas se deslocaram ao Largo Glênio Peres, em frente ao Mercado Público, para promover manifestações junto ao boneco que representa o mascote da Copa do Mundo de 2014 – o afamado Tatu-Bola. 

Quando essa movimentação começou, a Brigada Militar estava parada ao redor do boneco, aparentemente inerte frente à caminhada da multidão. Tendo em conta diversos relatos, os policiais permitiram que várias pessoas ultrapassassem a grade que protegia o mascote, o que, mediante a exaltação de ânimos, deflagrou o que apenas pode ser descrito como uma “batalha campal”. Sessenta policiais militares do Pelotão de Operações Especiais (POE) do 9° Batalhão da Polícia Militar, além de tropas da Guarda Municipal, foram deslocados ao local. Para conter o avanço da multidão, foram utilizadas bombas de gás lacrimogêneo e tiros com munição não-letal. Como resultado, ao menos vinte manifestantes restaram feridos e outros oito foram detidos pela Brigada Militar.

Certamente a necessidade de repressão da multidão por parte dos agentes públicos foi o descontrole de alguns cidadãos, os quais transformaram uma manifestação inicialmente pacífica em um ato distante dos seus propósitos iniciais. Mas nada justifica os excessos cometidos pelos policiais com relação às pessoas presentes no local. Exemplo claro desses excessos é o que aconteceu com Gabriela Kliemann Dias, a qual residiu em Santo Ângelo por quatro anos. Atualmente morando em Porto Alegre, Gabriela é estudante de jornalismo e colaboradora do Facool, empresa que atua no ramo. Com a intenção de fazer a cobertura jornalística da manifestação, Gabriela foi agredida por três policiais enquanto filmava a ação com um telefone celular. O vídeo que comprova a agressão aos 3min de gravação pode ser acessado no YouTube (http://www.youtube.com/watch?v=4N6L8pXlR3g&feature=youtu.be), considerando-se que o mesmo já se encontra em posse da Secretaria de Segurança Pública do Estado e do Ministério Público.

“Eu fui gravar uma guria sendo espancada no chão por um policial e acabei sendo detida, me jogaram no chão, pegaram meu celular e quando eu disse que não era vagabunda (eles estavam me chamando não só disso) e afirmei que era estudante de jornalismo, resolveram me algemar e me levar pra delegacia”, relata Gabriela, que afirma também que os policiais colocaram um cassetete no seu pescoço e tentaram de toda forma arrancar seu telefone celular. “Até que eu comecei a apanhar, pisaram no meu seio e eu entreguei o celular. No caminho, após ser detida, um deles estava quase quebrando meu braço e eu pedia pra ele parar e ele dizia: ‘vagabunda, eu vou quebrar esse teu bracinho’”. Como se percebeu nos dias posteriores à manifestação, a cobertura da imprensa foi massivamente no intuito de “criminalizar” os ativistas. Porém, mesmo que se admita que vários manifestantes tiveram condutas reprováveis, excessos cometidos pelos agentes policiais presentes no local merecem ampla investigação.

À parte essas considerações, a problemática que envolve o caso me parece clara, pois quando um jornalista é agredido, há um cuspe na cara da opinião pública e da democracia. Além disso, quando forças policiais se reúnem em torno de um boneco inflável, como se tivessem intenções de “protegê-lo”, há evidências de que vivemos em uma sociedade esquizofrênica. O preocupante, contudo, é que quando Gabriela, a porrada e o Tatu-Bola são fatores que compõe o mesmo trinômio, percebemos claramente que a ascensão do conservadorismo brasileiro é voz ativa na construção de um Estado que está anos-luz distante das disposições republicanas contidas na Constituição Federal. Diante de tamanhas bizarrices, uma última: escrevo tais linhas em 2012. Convenhamos que as mesmas palavras, com algumas poucas alterações, cairiam perfeitamente aos anos de 1969 a 1974, período no qual o Governo Médici mergulhou o país em um dos momentos mais duros do Regime Militar. O que espero é que este texto não seja um sintoma ou talvez uma espécie de “premonição” quanto aos dias que virão. Do contrário, eu, Gabriela e milhões de brasileiros enfim conheceremos o pau de arara.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

SETE BREVES CONSIDERAÇÕES PARA UM ANO ELEITORAL: PARTE FINAL.

O que se comprovou com o pleito do último domingo é que um senso conservador impera no Brasil. “Mas conservar o quê?”, perguntará algum leitor. Simples: conservar o cenário político brasileiro da forma como sempre se configurou. Enquanto o eleitor aceitar esse coronelismo velado que perpassa todos os veios da República, absolutamente nada se modificará. Persistirá, ao contrário, a perspectiva de que o Estado, em sua composição política, existe apenas para favorecer interesses privados completamente distantes de preocupações coletivas.
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Algo que se percebeu claramente no transcorrer da campanha eleitoral foi a “infantilização do voto”. Ou seja: o eleitor confia que determinado candidato resolverá todos os seus problemas. É a consciência do filho que deposita todas as suas expectativas em seu genitor. Perdurando essa noção, o Estado brasileiro permanecerá como “um grande pai”, jamais organizado a partir de uma tônica racional, relegando às traças qualquer lógica em prol da pura politicagem.
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O alarde em função da Lei da Ficha Limpa ocorrido nos últimos meses teve sua razão de ser. Embora alguns não tenham percebido, a Lei da Ficha Limpa serve para proteger o eleitor dele mesmo. Funciona assim: se determinado candidato detém “ficha suja”, não pode constar na urna, sendo que, por consequência, não pode receber o voto do eleitor – se pudesse, receberia. Como bem falou David Coimbra em coluna publicada semana passada na Zero Hora, a Lei da Ficha Limpa serve para que reconheçamos que não passamos de uns abobados. O absurdo é que isso é extremamente necessário.
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Não concordo com a expressão que chama as eleições de “festa da democracia”. Levada ao pé da letra, traduz um pensamento comum brasileiro que julga que o único momento de se fazer política é em ano eleitoral. Na esteira dessa percepção, visões críticas e tentativas de participação na organização do Estado acabam sufocadas, subjugadas por uma massa populacional que não deseja ser nada mais que “pelego” de alguns poucos mandatários. O brasileiro, em sentido geral, aprecia sua semelhança a um “boi de canga”.
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A composição das prefeituras, mesmo que muitos municípios importantes tenham levado seu pleito para o segundo turno, demonstrou, em âmbito amplo, um “retorno da direita” – reconhecendo-se, porém, a “permanência da esquerda” (se é que essas palavras trazem algum sentido atualmente). Parece que alguns partidos, afastados há anos do poder, fizeram das tripas coração para retornar às cadeiras dos Executivos Municipais. O problema é que esse processo trouxe consigo ramagens de interesses conhecidos por todos, os quais, anos atrás, levaram diversas cidades ao limbo da estagnação desenvolvimentista. O que fica nítido é que o brasileiro é um ser imediatista acometido de um esquecimento crônico. 
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Ainda que muitos discordem, são nas Câmaras de Vereadores que crescem as novas elites políticas nacionais. Trata-se do seu útero. O que se observou é que pouca modificação houve em suas composições, mesmo que seja impossível nesse momento traçar um diagnóstico que perpasse todos os municípios brasileiros. O mais triste nesse sentido é que a “infantilização do voto” se fez presente também aqui: se os prefeitos são vistos como “pais”, os vereadores são vistos como “padrinhos”. O preocupante é que essa atitude não difere em nada daquela dos “mensaleiros” que estão sendo julgados pelo Supremo Tribunal Federal. Cada vez que um eleitor vende ou troca seu voto, surge um novo corrupto no Brasil.
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Em política, na ausência de enxadas utilizamos colheres. O que não vale é dizer que um unicórnio puxará o arado. Em tempo de campanha, isso até funciona. Mas a “Terra do Nunca” não passa de fantasia, ainda que o ser humano tenha a tendência a confiar mais na “magia” que na “realidade”. À parte isso, independente de siglas, desejo inteligência e comprometimento para todos os candidatos eleitos. Se a partir do dia primeiro de janeiro alguns colocarão em curso seus objetivos de campanha, outros colocarão na estrada sua vigilância e atenção com relação a tudo quanto será dito e principalmente feito: assim esperando, a vida segue.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

Carta aberta aos(às) eleitores(as) de Santo Ângelo.

Senhores(as) eleitores(as).

Como algum(a) dos(as) senhores(as) certamente percebeu, na semana passada utilizei este espaço para publicar uma “carta aberta aos(às) candidatos(as) a prefeito e vereador(a) de Santo Ângelo”. Por conta de um desdobramento lógico, nesta semana publicarei outra “carta aberta”, desta vez direcionada aos(às) senhores(as) eleitores(as). Com a intenção de colaborar com o pleito que ocorrerá no próximo domingo, tratarei das principais funções do prefeito, das principais funções dos(as) vereadores(as) e, derradeiramente, abordarei alguns pontos que, penso, não servem de subsídios para a definição do seu voto. Dessa maneira, ciente do meu mirrado papel, seguem algumas humildes, apartidárias e idealistas considerações.

Em primeiro lugar, trato do prefeito. Dentre as principais funções do prefeito, que é o chefe do Poder Executivo Municipal, não se encontra o favorecimento de certos empresários em detrimento dos demais, não se encontra um “empurrão” para que qualquer pessoa seja favorecida em algum concurso público e não se encontra a concordância com ilegalidades praticadas por servidores(as) públicos(as) municipais, estaduais e federais. De outra forma, encontra-se o governo da cidade de forma conjunta com os(as) vereadores(as), a representação do povo na busca por melhorias, a reivindicação de convênios, benefícios e auxílios para o município, a apresentação de projetos de lei à Câmara Municipal, a sanção, a promulgação, o veto e a publicação de leis apresentadas pela Câmara, a intermediação política com outras esferas do poder, o zelo pela limpeza da cidade, promovendo a manutenção de postos de saúde, escolas e creches, bem como a administração e a aplicação de impostos (IPTU, IPVA, ITU) visando o benefício do município.

Em segundo lugar, trato dos(as) vereadores(as). Dentre as principais funções dos(as) vereadores(as), que são os(as) representantes do Poder Legislativo Municipal, não se encontra o pagamento de jantares, festas de aniversário ou de casamento, não se encontra a promessa de cargos ou Secretarias mediante pura manipulação eleitoreira e não se encontra o agendamento de consultas médicas para as pessoas mais necessitadas. De outra forma, encontra-se a feitura de leis que digam de interesses locais, a elaboração de decretos legislativos, resoluções, indicações, pareceres ou requerimentos, a fiscalização das contas do Poder Executivo Municipal, o zelo pelo bom uso do dinheiro público mediante a aprovação da Lei de Diretriz Orçamentária elaborada a partir de uma análise profunda do Plano Diretor do Município, bem como a representação da população local com a promoção de seminários, debates e audiências públicas que visem a conscientização cidadã fincada em parâmetros republicanos e democráticos com a intenção de que sua vereança sirva como caixa de ressonância aos interesses do município.

Em terceiro lugar, trato da sua escolha, senhor(a) eleitor(a). Assim, peço que não deixe que a promessa de uma escrituração de terreno defina seu voto, peço que não deixe que a promessa de um CC defina seu voto, peço que não deixe que uma cesta básica ou a “doação” de obras universitárias defina seu voto, peço que não deixe que pesquisas que apontam tal ou qual candidato para a “vitória” definam seu voto, peço que não deixe que a “cegueira ideológica” impeça que seu voto vá contra o partido pelo qual o(a) senhor(a) tem apreço, peço que não deixe que bom-mocismos feitos de sorrisos e tapinhas nas costas definam seu voto, peço que não deixe que a “ética da boa vizinhança” defina seu voto e peço que não deixe que o temor pelo seu emprego defina seu voto.

Pelo contrário, peço que vote de maneira consciente, peço que faça com que sua decisão não seja designada pela emoção ou pela rasa empatia, mas seja, de outro modo, definida pela racionalidade, pela honestidade e pela obrigação que o(a) senhor(a) tem de demonstrar sua preferência política não em nome dos seus interesses pessoais, mas em nome da sua cidade, depositando seu voto no candidato que julgar mais preparado para o exercício das funções de prefeito e vereador(a). Acima de tudo, senhor(a) eleitor(a), lembre-se que só existem corruptos se existirem corruptores – ou seja: a responsabilidade pela dignidade política do Brasil não é sua ou minha, mas é nossa.

Contando com seu comprometimento e coragem,

Eduardo Matzembacher Frizzo.

Santo Ângelo (RS), 4 de outubro de 2012.

P.S.: Tanto o texto anterior quanto este, foram publicados no Jornal das Missões, de Santo Ângelo (RS), com o intuito de contribuir com o pleito local. Embora algumas das suas linhas tragam considerações genéricas, foram postados aqui sem maiores pretensões.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Carta aberta aos(às) candidatos(as) a prefeito e vereador(a) de Santo Ângelo.

Senhores(as) candidatos(as).

Sou um eleitor como outro qualquer. Em função dos direitos políticos que trago, meu voto será contabilizado da seguinte forma: 01 (um) – e nada mais. Mas tenho de admitir que o fato de escrever para um jornal de grande circulação no município e na região, responsabiliza-me moralmente no sentido de trazer para o(a) leitor(a) contribuições minimamente válidas ao seu cotidiano. Caso algum(a) dos(as) senhores(as) acompanhe minha modesta e recente coluna neste diário, deve ter ciência que trato de assuntos diversos, abrangendo, como diria Douglas Adams, “a vida, o Universo e tudo mais”. Hoje, porém, decidi, consciente do meu ínfimo papel, fazer alguns pedidos aos(às) caríssimos(as) senhores(as) candidatos(as). Infelizmente não poderei embasar legal e logicamente meus pedidos em função do curto espaço destinado a este texto. Da mesma maneira, não citarei nomes e me restrinjo, ciente das minhas limitações e pleno de respeito apartidário, aos termos que seguem.

Em primeiro lugar, trato das promessas. Assim, peço que não prometam a escrituração de terrenos em área de proteção permanente às margens do Itaquarinchim, peço que não prometam a extinção de todos os CCs da Prefeitura e da Câmara de Vereadores, peço que não prometam a distribuição de mais de setecentas bolsas integrais e parciais para universitários do município, peço que não prometam a doação de material de construção para toda e qualquer pessoa que o requisitar à respectiva Secretaria, peço que não prometam isenções ou absurdidades no que diz de impostos essenciais à vida financeira do município, peço que não prometam cargos a eleitores(as) com a simples intenção de captar seu voto e peço que não favoreçam quaisquer correntes religiosas com relação ao que diz da realização de eventos e demais festividades na cidade. Com relação às promessas, os(as) senhores(as) candidatos(as) haverão de concordar que os(as) eleitores(as) de hoje são melhor informados(as) que os(as) eleitores(as) de ontem – e que, compulsando mesmo fatores legais que possam entrar em questão, muitas dessas “obrigações assumidas para o futuro” são basicamente de impossível cumprimento.

Em segundo lugar, trato da campanha. Assim, peço que não comprem votos por meio de presentes na forma de obras universitárias, peço que não procedam com o pagamento de festas de casamento e de aniversário, peço que não distribuam panfletos anônimos difamando determinados(as) candidatos(as), peço que não paguem R$ 400,00 para um(a) morador(a) instalar material de campanha em frente à sua residência, peço que não financiem reconstruções de moradias atingidas pelo recente temporal que atingiu a região, peço que não digam que um(a) eleitor(a) perderá seu benefício assistencial concedido pelo INSS caso o(a) senhor(a) não venha a se eleger, peço que não insuflem ânimos violentos em seus cabos eleitorais, peço que na noite que antecederá as eleições não impeçam a livre circulação de pessoas em determinados bairros e peço que mantenham a campanha que se dará nos próximos dias em um nível civilizado, racional e cortês, respeitando a oposição e rebatendo argumentos com calma e coesão. Com relação à campanha, os(as) senhores(as) candidatos(as) haverão de concordar que crimes são crimes e devem ser interpretados como tais – e que, embora o Brasil seja um país essencialmente patrimonialista e clientelista com respingos coronelistas, os(as) senhores(as) detém o dever de reverter esse cenário em prol do amadurecimento da democracia brasileira.

Em terceiro lugar, trato do amanhã. Assim, peço que visualizem os problemas da cidade não “jogando” a responsabilidade para administrações passadas ou atuais, mas buscando soluções que não estejam puramente relacionadas a interesses eleitorais ou picuinhas entre grupos que de forma alguma atentam aos interesses da coletividade. Peço também que, caso venham a assumir o cargo que almejam, os(as) senhores(as) se comprometam com os princípios republicanos afeitos ao respeito à dignidade da pessoa humana e condicionados principalmente pela fraternidade, pela igualdade, pela liberdade, pela humanidade e pela diferença. Peço ainda que tenham perfeita noção de que suas concepções morais de qualquer natureza, normalmente não estão “casadas” com os anseios coletivos – sendo que são estes anseios e desejos que os(as) senhores(as) representarão caso venham a se eleger.

Tendo em conta tudo quanto falei acima, senhores(as) candidatos(as), respeitosamente peço hombridade, civilidade, humildade, inteligência, compromisso e honestidade – qualidades humanas que existem independentes de partido, instrução, credo, cor, sexo ou preferências futebolísticas.

Contando com sua compreensão e confiança,

Eduardo Matzembacher Frizzo.

Santo Ângelo (RS), 27 de setembro de 2012.

domingo, 23 de setembro de 2012

UM CANTO TODO FEITO DE MUDANÇAS.

Semana Farroupilha. Rio Grande do Sul imerso em comemorações. Emoções afloradas, bailes aqui e acolá, seres com pilchas cheirando à naftalina e escolas levando alunos para cafés campeiros nos CTGs. Acho tudo isso muito bonito. Condiz com certa unidade cultural que habita a terra sulina. Mas ao mesmo tempo, acho indignas quaisquer atitudes tradicionalistas puristas. Isto é: sujeito acha que apenas uma e só uma vertente cultural detém valor. Trata-se de uma postura totalmente arcaica, preconceituosa e nada afeita aos tempos atuais. Causa, inclusive, uma opressão moral e atitudinal exposta claramente pelo conservadorismo gaúcho que se soma a determinado bairrismo caolho e sem razão que carregamos.

Fato é, porém, que já tentei enveredar pela cena musical como compositor nativista. Escrevi algumas letras e compus canções, sempre em parceria com meu amigo Antonio Fontoura. Pensando sobre isso, é que hoje decidi publicizar um escrito que me vazou há tempos e que ainda está parcamente musicado como uma milonga. Em suas linhas, expressei minha convicção de que inexistem parâmetros certos ou errados em se tratando de manifestações culturais. Também evidenciei que não me cabe, como homem da cidade, cantar coisas de uma realidade campesina que desconheço totalmente. Por fim, busquei uma vertente poética afeita à necessidade de união, fraternidade e convivência pacífica entre diferentes, tendo em conta nossa inevitável solidão cósmica e a perspectiva certa e inafastável da nossa finitude. Penso que apenas assim poderemos atingir um novo nível de desenvolvimento humano, desapegado de localismos que nada nos dizem afora seu teor anacrônico – mas conectado com uma noção planetária envolta em um senso de unidade global.

Por esses motivos, consistindo em uma modesta e descompromissada homenagem à Semana Farroupilha, arraigada ao significado pessoal que visualizo no dia 20 de setembro, segue “Um canto todo feito de mudanças”, letra que escrevi com base no ideário que resumidamente expus acima, o qual traz como única vereda um sentido profundo de liberdade e companheirismo existencial.

Não quero mais cantar essa saudade / Das coisas que não pude conhecer
Não quero mais cantar essas paisagens / Que só a imaginação pôde trazer
Não quero mais cantar só por um chão / Se não há uma bandeira que nos une
Nem quero mais cantar o coração / Que faz a minha vida mas me pune
Não canto mais por algo ou por alguém / Porque sei da fraqueza da minha voz
Só canto porque vejo bem além / Alguma ideia que une a todos nós

Por isso que meu canto é de futuros / É feito de amanhãs e esperanças
Por isso que meu canto é pela união / Da terra e do homem pra mudanças
Distantes de passados ou presentes / Que cortam essa noite do agora
Mas relampejam antes do poente / As mãos que não cansaram da demora

Sabendo do meu canto sei que devo / Cantar não só respeito ou palavras
Que morrem sem saber que a cada rima / Se tornam nada mais que umas escravas
Meu canto não pede pra ser medido / Por aqueles que julgam a canção
Porque todo seu corpo é tecido / Com notas livres de toda opressão
Meu canto se quer som não só da voz / Que pra agradar só canta o que convém
Porque meu canto vai bem mais além / De toda solidão que há em nós

Por isso que meu canto é de futuros / É feito de amanhãs e esperanças
Por isso que meu canto é pela união / Da terra e do homem pra mudanças
Distantes de passados ou presentes / Que cortam essa noite do agora
Mas relampejam antes do poente / As mãos que não cansaram da demora

Por uma voz que não seja só uma / Mas seja a voz de todas as esperanças
Da terra e do homem pela união / De um canto todo feito de mudanças